sábado, 28 de junho de 2014

Fugindo e fugindo...

     Reinaldo era um jovem bastante agradável. Era capaz de conquistar qualquer garota que desejasse, não somente por sua beleza, mas principalmente devido o carisma e a aura que carregava sobre si -- era invejável. Sua noiva, porém, parecia estar em uma frequência totalmente diferente. Sempre parecia entediada na companhia do noivo, e algumas vezes até deixava escapar um bocejo, como naquela noite do jantar. O jovem era um bom observador, e isso de certa forma o entristecia.

  -- Ah! Nem contei pra você amor... A empresa antecipou minhas férias para Abril, e finalmente vamos poder conhecer Buenos Aires! -- era uma tentativa de arrancar aquele sorriso que Reinaldo não vira há anos.

  -- Que bom amor. Você já percebeu que aqueles dois estão brigando feio? -- disse Suelen ingenuamente, referindo-se ao casal da mesa dezenove -- a mais escondida do restaurante.

    "Não faço ideia do que posso ter feito, mas simplesmente ela perdeu o interesse por mim! Como pode ser? Ela sequer faz questão de disfarçar o tédio, parando de apoiar o rosto que encara a mesa dos casais que não querem ser percebidos. Mas hoje não! Hoje será um dia diferente para nós dois, definitivamente."

     Na realidade, Reinaldo assentiu, com uma tristeza com a qual já havia se acostumado, mas desta vez seria diferente mesmo. Era um jantar romântico que fora reservado há semanas, planejado para pedir a sua amada noiva em casamento. Imaginava que as coisas voltariam ao normal no futuro, e só precisava tomar uma atitude, afinal o relacionamento de nove anos já estava bastante desgastado e implorava por um novo capítulo. O plano inicial era esse, mas subitamente o jovem resolveu mudar de ideia. Pegou uma das garrafas de vinho tinto suave encomendadas com antecedência e levantou-se da mesa, com certa impulsividade. Todo o restaurante notou a alteração na feição de Suelen.

  -- Cansei. Não quero mais você. -- disse. Era um jovem de poucas palavras, mas sempre firme em suas decisões -- talvez até demais. -- Tentei fazer de você minha mulher, mas cansei de procurar maneiras de te fazer bem. Seu amor está em um labirinto, e eu me perdi nele. Adeus.

     E antes que Suellen pudesse reagir, Reinaldo deixou o restaurante rapidamente, assim como o amor da sua vida, as chaves do carro quase quitado e a sua carteira. Aonde ele foi?
O corpo do jovem foi encontrado no quilômetro 319 da rodovia BR-174, algumas semanas depois. A causa da morte? Inanição. Reinaldo caminhou durante vários dias na estrada, onde sobreviveu aos perigos da vida selvagem milagrosamente. O corpo estava extremamente desnutrido, mas na verdade já vinha abandonando a vida, sempre que temia perder a única garota que o interessava e faltava coragem para encarar a realidade de que o relacionamento precisava de um fim. O jovem desistiu de fugir dos seus piores medos, que eram cada vez mais reais, e decidiu tomar a atitude de fugir de verdade, mas, como sempre... Não sabia para onde fugir.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Pensamentos Pré-Dublin #1

Então, eu passei um tempinho sem escrever, pois foram dias bastante corridos e a preguiça também não me largou. Ah, foda-se!

Aconteceram algumas coisas importantes nestes dias. Contei a minha mãe sobre minha ideia de fazer o intercâmbio na Irlanda, e depois de muita conversa ela concordou! Tenho um bom planejamento e os recursos para tornar esse sonho real. A passagem já foi comprada, e no dia 25 de Novembro já estarei em Dublin, graças à Deus. E conforme o tempo vai passando, vou me aproximando ainda mais dessa realidade. Oh Dublin, espero que seja uma mãe para mim, pois vou sentir muita saudade da minha mãe aqui no Brasil. Mas os torturantes dias de ansiedade até lá serão um pouco difíceis, já que não é tão fácil se despedir de pessoas importantes e desatar todos os nós problemáticos da vida aqui.

Infelizmente eu tive que me despedir de uma pessoa que eu gostava de verdade. Essa garota nem imagina que escrevo sobre ela, mas na realidade foi a pessoa que me deu o empurrão e a coragem que precisava para buscar os meus sonhos. É bastante estranho, pois ficamos juntos em Fevereiro por apenas duas semanas e meia! Queria muito que fosse minha próxima namorada, mas ela tinha alguns problemas em relação à insegurança que eram perigosos, e hoje eu percebo que não poderei ajudá-la. Contei que estava saindo do país em breve, e pensei em me despedir, ou tentar fazer dela minha namorada, mas trata-se de uma atitude super egoísta, principalmente pelo fato de sumir depois. No final, acabei sendo um idiota e disse o que não deveria, me colocando em situação de vantagem, como se só quisesse usá-la durante o tempo que me resta no Brasil. Foi um erro que talvez não possa me arrepender depois, talvez não seja o momento certo para nós dois. Mas sem dúvida, a Andrezza foi uma pessoa muito importante na minha vida. Desejo a ela toda a felicidade do mundo, não que ela possa merecer ou não, mas simplesmente porque gosto muito dela.

Hoje choveu bastante em Manaus, e enquanto tentava estudar -- isso sempre acontece -- eu mergulhei em alguns vídeos do Youtube (Marião na Europa, Vlog do Magrelo, etc.) e curiosamente pude ver uma dificuldade que todos teremos se quisermos lutar pelo nossos sonhos. Saudade. Uma hora ela chega, e vem como um sentimento devastador. Eu ainda não sei muito bem o que quero para mim, mas quero viajar o mundo, tocar minhas músicas para o mundo, escrever livros, atuar em algum filme underground, aparecer na televisão, sei lá... Mas em qualquer um desses caminhos terei que deixar pessoas importantes por um tempo. Até então, já larguei um bom emprego, uma boa namorada, um time de futebol americano campeão, uma possível banda de sucesso, uma boa bolsa na faculdade para um bom curso, e amanhã terei que largar grandes amigos, meu cachorro que amo tanto, meu pai e minha mãe. E estarei sozinho na Europa, com a companhia de pessoas desconhecidas que sequer falam português. Mas é o preço a ser pago no caminho aos meus sonhos.

Qual é o preço do seu sonho, afinal?

Usain Bolt

Comecei a ler ontem uma biografia sobre o homem mais rápido da Terra, Usain Bolt. Todos tem uma história incrível para contar, imagine uma pessoa como ele! Na realidade, a história dele só começou a fazer sentido pra mim hoje à noite, quando percebi que ele não somente viveu de glórias (o cara foi um prodígio e vencia todos sem dificuldade!), e teve seus momentos difíceis, suas dúvidas sobre a carreira, suas dores, e suas alegrias. Se ele tivesse se conformado com as dores e as derrotas que nos alcançam, talvez nem fosse tão reconhecido, e talvez estivesse contando aos seus filhos – acidentais – que tivera bastante glória, embora soubesse dentro de si que havia sido derrotado por si mesmo, pelos seus medos.

Pela manhã havia prometido a mim que levaria o Ruk para passear, mas me entretive com o violão e com uma bela canção que compus, e mudei de ideia: hoje vou trabalhar no banheiro que estou reformando, amanhã o levo pra passear – eu juro. Em seguida, fiquei ouvindo os lamentos e as bebadices do meu irmão enquanto trabalhava (confesso que me deu ódio aturá-lo). O trabalho parecia mais difícil hoje, acertei três vezes a minha mão utilizando a marreta, e em certo momento decidi que era hora de parar.

O momento à tarde foi tão esplêndido que mesmo com esforço, ainda não consegui lembrar exatamente como comecei a pesquisar sobre o assunto (intercâmbio). Ah! Lembrei! Eu estava aprendendo uns solos das músicas da Banda quando recebi um e-mail do Marião da Seda College, com os orçamentos e as despesas previstas para o curso de inglês com duração de 6 meses e 6 meses de férias. Um ano na Irlanda. Um ano. Apenas um valor que eu tenho em conta. A ideia foi tomando conta de mim da mesma forma como fui mudando minha maneira de pensar em relação à vida: aos poucos. Fiz várias contas e pesquisei todo tipo de preços e orçamentos e meu Deus! Por que não havia feito isso antes?! Logo a ideia me preencheu por completo e senti em minha alma que esse é o momento. Hoje é o dia para ser feliz. Na verdade, a viagem só deve sair em outubro, mas a sensação de que esse sonho poderá se realizar já me tirou do sério. Só temos um problema, André.

Preciso de mais cinco mil reais.

Esse dinheiro completaria o que preciso para comprovar minha estadia no país (três mil euros). Tenho problemas menores -- por exemplo, contar a notícia à meus pais e organizar a logística até lá. Há dois dias entreguei uma carta à minha mãe revelando meus maiores sonhos, e ela atualmente é a única detentora dos meus maiores segredos. Ela reagiu carinhosamente nos dias seguintes -- o que pode ser um bom sinal, mas ela não está em Manaus para conversarmos pessoalmente. Penso em pedir esse dinheiro emprestado dela para comprar as passagens aéreas e quando receber meus primeiros salários europeus compensarei esse empréstimo. Ela retorna dentro de dez dias, e este é o tempo para elaborar meu projeto e apresentar à ela – e que Deus me abençoe.


Quando percebi a possibilidade de tornar este sonho real, me senti como Veronika: preciso me despedir de meus amigos e aproveitar meus últimos momentos aqui em Manaus. Passei horas pensando nos modos como farei isto, e totalmente inundado por essa ideia. Senti minhas músicas o máximo -- eu me senti o máximo. Sinto que uma aura extremamente positiva transborda do meu corpo, e o mais precioso: sinto-me vivo. E feliz. Mas lembro-me da história de Usain Bolt: não posso ser preguiçoso e subestimar meus adversários, meus obstáculos. Preciso treinar – e trabalhar o suficiente para me tornar maior do que todos eles. Hoje.